TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO PIAUÍ
GABINETE DO JUIZ AUXILIAR
REPRESENTAÇÃO (11541) Nº 0601220-47.2018.6.18.0000 (PJe) - Teresina - PIAUÍ
RELATOR: JOSE GONZAGA CARNEIRO
REPRESENTANTE: MERLONG SOLANO NOGUEIRA
Advogados do(a) REPRESENTANTE: DANIELLA SALES E SILVA - PI11197, ALINE NOGUEIRA BARROSO - PI8225, GARCIAS GUEDES RODRIGUES JUNIOR - PI6355, GERMANO TAVARES PEDROSA E SILVA - PI5952
REPRESENTADO: FACEBOOK SERVIÇOS ONLINE DO BRASIL LTDA, EDMILSON VASCONCELOS
Advogados do(a) REPRESENTADO: SILVIA MARIA CASACA LIMA - SP307184, PRISCILA PEREIRA SANTOS - SP310634, CAMILA DE ARAUJO GUIMARAES - SP333346, PRISCILA ANDRADE - SP316907, NATALIA TEIXEIRA MENDES - SP317372, RODRIGO MIRANDA MELO DA CUNHA - SP266298, CARINA BABETO CAETANO - SP207391, JANAINA CASTRO FELIX NUNES - SP148263, CELSO DE FARIA MONTEIRO - SP138436, RODRIGO RUF MARTINS - SP287688, DANIELLE DE MARCO - SP311005
Advogado do(a) REPRESENTADO:
Vistos e apreciados.
Trata-se de Representação proposta por MERLONG SOLANO NOGUEIRA, candidato a Deputado Federal, em face de FACEBOOK SERVIÇOS ONLINE DO BRASIL LTDA e EDMILSON VASCONCELOS, por suposta propaganda irregular.
Sustenta o Representante que o Representado "proferiu, no dia 25 de agosto de 2018, comentário em que pratica, deliberadamente, propaganda negativa e fake news, com o intuito de ferir a imagem do candidato Representante ao cargo de Deputado Federal”.
Expõe que o internauta de perfil no facebook EDMILSON VASCONCELOS proferiu na página de CELSO VIEIRA o seguinte comentário a respeito do representante: “Esse está com uma estrutura financeira poderosíssima aqui em Floriano, proveniente do erário público”.
Com base nas alegações expendidas, requer a imediata intervenção da Justiça Eleitoral para que, liminarmente, o Facebook retire do ar o comentário ofensivo na URL https://www.facebook.com/photo.php?fbid=1603966009750162&set=a.613653805448059&type=3 e, ainda, que seja deferido o direito de resposta.
No mérito, que o Facebook forneça o endereço de e-mail e o endereço de IP do representado, assim como, os dados de cadastro para a sua correta identificação; e que seja julgada procedente a Representação para reconhecer a ocorrência de propaganda negativa, com a consequente aplicação da sanção máxima de multa e da veiculação do pedido de direito de resposta em anexo à exordial.
Indeferida medida liminar ante ausência do periculum in mora.
Regularmente citado, o representado FACEBOOK SERVIÇOS ON LINE DO BRASIL apresentou defesa em que arguiu: a) a primazia da liberdade de expressão e menor interferência no debate democrático, com preferência à remoção de conteúdos específicos em vez de perfis inteiros; b) inexistência de anonimato na espécie; c) inexistência de dever de fiscalização e imprescindibilidade de ordem judicial específica para remoção de conteúdo; d) não incidência de multa eleitoral.
Intimado para apresentar a URL específica do comentário, o representante informou que já havia sido retirada a postagem ofensiva, fato que impossibilitaria a apresentação da URL.
Com vistas dos autos, o Ministério Público Eleitoral apregoa que a URL específica é imprescindível para segura identificação do conteúdo a ser removido e que diante da ausência desta URL não foi possível confirmar o conteúdo da publicação. Destaca que a manifestação espontânea na internet de pessoas naturais em matéria político-eleitoral, mesmo que sob a forma de elogio ou crítica, não será considerada propaganda eleitoral. Ao final, manifesta-se pela improcedência da presente representação.
Concisamente relatado. DECIDE-SE.
A representação em cotejo tem por escopo aferir suposta realização de propaganda negativa irregular na internet, consistente em comentário que veicula propaganda negativa e fake news, com o intuito de ferir a imagem do candidato, ora representante.
Propaganda eleitoral consiste em mensagem que visa influir na vontade do eleitor, na medida em que conquista sua preferência na tomada de decisões políticas, situação que, licitamente, importa em consequências no resultado da disputa eleitoral. O legislador expressamente listou comportamentos proibidos na resolução TSE 23.551/2017:
Art. 17. Não será tolerada propaganda, respondendo o infrator pelo emprego de processo de propaganda vedada e, se for o caso, pelo abuso de poder (Código Eleitoral, arts. 222, 237 e 243, incisos I a IX; Lei nº 5.700/1971; e Lei Complementar nº 64/1990, art. 22)
(…)
X - que caluniar, difamar ou injuriar qualquer pessoa, bem como atingir órgãos ou entidades que exerçam autoridade pública;
Art. 22. É permitida a propaganda eleitoral na internet a partir do dia 16 de agosto do ano da eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 57-A).
§ 1º A livre manifestação do pensamento do eleitor identificado ou identificável na internet somente é passível de limitação quando ocorrer ofensa à honra de terceiros ou divulgação de fatos sabidamente inverídicos.
Verifica-se que o legislador entendeu de fixar a proibição de calúnia, difamação e injúria quando da realização de propaganda. A mens legis, como se observa, é proibir a veiculação de ofensa à honra de candidato.
Inicialmente, importante destacar o papel da liberdade de expressão nas eleições 2018. o Exmo. Ministro Luiz Fux, Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, em sede de Acórdão no Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 9-24.2016.6.26.0242 – Classe 6 – Várzea Paulista – São Paulo, de maneira brilhante trata do tema: “No Direito Eleitoral, o caráter dialético imanente às disputas político-eleitorais exige maior deferência às liberdades de expressão e de pensamento. Neste cenário, recomenda-se a intervenção mínima do Judiciário nas manifestações próprias da vida democrática e do embate eleitoral, sob pena de se tolher o conteúdo da liberdade de expressão (…) Na esteira desses éditos, cumpre às cortes eleitorais o papel de assegurar a máxima amplitude do debate, somente intervindo em hipóteses estritas, inevitáveis e excepcionais, quando as atividades de comunicação representem, sem margem para dúvidas, riscos concretos (i) para a autodeterminação na formação da opinião eleitoral ou, em última instância, (ii) para a própria integridade da disputa.”.
A respeito de propaganda eleitoral negativa, “a propaganda negativa é defendida como uma oportunidade de trazer à tona elementos que estavam secretos sobre determinados candidatos e que podem ser importantes para a apreciação e avaliação por parte da população. Em uma eleição em que apenas positividades são evidenciadas, há pouca sensibilização dos cidadãos e poucos elementos distintivos entre os candidatos. Dentro de um modelo de democracia que tem o cidadão como parte central de seu processo, é necessário possuir as ferramentas possíveis para que ele tenha acesso amplo às informações e possa, a partir de seu próprio juízo, determinar quais informações são relevantes para a sua tomada de decisão”. (RAIS, Diogo (Coord.). Direito eleitoral digital. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018).
Ainda a respeito do mesmo tema, segundo Desposato, “a escassez de propaganda negativa é ruim, uma vez que esta permite que os eleitores tenham acesso ao maior número de informações possível. Uma vez que os próprios candidatos não têm intenção de falar de suas falhas, é necessário que outros falem. Com isso, é possível fortalecer a accountability dos candidatos” (DESPOSATO, Scott. A propaganda negativa como instrumento democrático. Entrevista realizada por Felipe Borba. Revista Compolítica, número 3, volume 2, jul/dez 2013).
Depreende-se do exposto que a simples propaganda negativa, per si, não representa um ilícito eleitoral, merecendo guarida dessa Justiça Especializada apenas quando a livre manifestação do pensamento, a liberdade de imprensa e o direito de crítica extrapolarem o exercício da liberdade de informação e de expressão.
Nesse sentido, cito Jurisprudências:
AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO.ELEIÇÕES 2012. PROPAGANDA ELEITORAL NEGATIVA. INTERNET. MULTA. ASTREINTES. DESPROVIMENTO. Na espécie, a irregularidade consistiu na divulgação, em sitio da internet, de material calunioso e ofensivo à honra e à dignidade do agravado, conteúdo que extrapolou o exercício da liberdade de expressão e de informação. O acórdão recorrido está em consonância com a jurisprudência do TSE, de que a livre manifestação do pensamento, a liberdade de imprensa e o direito de crítica não encerram direitos ou garantias de caráter absoluto, atraindo a sanção da lei eleitoral, a posteriori, no caso de ofensa aos direitos de personalidade. Precedentes: Rp 1 975-05/DF, ReI. Mm. Henrique Neves, PSESS de 2.8.2010 e AgRg-Al 800533, ReI. Mm. Nancy Andrighi, DJe de 20.5.2013.
“[...]. Eleições 2014. Propaganda eleitoral negativa extemporânea. Configuração. Multa. [...] 1. Consoante a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, a configuração da propaganda eleitoral extemporânea independe da escolha dos candidatos em convenção partidária. Precedente. 2. A divulgação de propaganda antes do período permitido pelo art. 36 da Lei 9.504/97 contendo imagem ofensiva à honra e à dignidade do governador do estado configura propaganda eleitoral negativa extemporânea. 3. O acórdão recorrido está em consonância com a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, no sentido de que o pluralismo político, a livre manifestação do pensamento, a liberdade de imprensa e o direito de crítica não encerram direitos ou garantias de caráter absoluto, atraindo a sanção da lei eleitoral no caso de ofensa a outros direitos, tal como o de personalidade. Precedentes. 4. O pedido expresso de voto não é condição necessária à configuração de propaganda, que, em sua forma dissimulada, pode ser reconhecida aferindo-se todo o contexto em que se deram os fatos. Precedentes. [...]” (Ac. de 17.3.2015 no AgR-REspe nº 20626, rel. Min. João Otávio De Noronha.) (grifado)
Ademais, não há previsão na legislação eleitoral pátria para multa em caso de propaganda negativa publicada contra candidato. Neste sentido, cabe reportagem a precedente do Colendo Tribunal Superior Eleitoral:
RECURSO ELEITORAL - PROPAGANDA ELEITORAL - INTERNET - FACEBOOK - MENSAGEM - PROPAGANDA ELEITORAL NEGATIVA - FATO OFENSIVO E INVERÍDICO - CONFIGURAÇÃO - MULTA - AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL - MULTA AFASTADA - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. A mensagem veiculada possui nítido caráter eleitoral e imputa fato ofensivo e sabidamente inverídico ao órgão ministerial, pois os dizeres incutem no eleitor a ideia de que o órgão agiu com parcialidade e de modo subserviente aos interesses do Poder Executivo Municipal, em inobservância às suas funções institucionais dispostas no art. 127, da Constituição Federal do Brasil.
2. Inexistindo previsão legal na Lei nº 9.504/97 acerca da imposição de multa, em caso de propaganda eleitoral negativa, é juridicamente impossível a aplicação da penalidade no caso concreto, com base no art. 24, da Resolução TSE nº 23.457/2015. 3. Recurso parcialmente provido para, tão somente, afastar a aplicação da multa.
(TSE RESPE: 000000763820166130278 URBELÂNCIA – MG, Relator: Min. Jorge Mussi, Data de Julgamento: 01/03/2018, Data de Publicação: DJE, Tomo 62, Data 02/04/2018, Página 79) (grifado).
Superada a legalidade de propaganda eleitoral negativa, necessário discorrer o pedido de direito de resposta.
Objetivando situar juridicamente a questão posta, vale transcrever os dispositivos legais aplicáveis a espécie.
Lei 9.504/1997
Art. 58. A partir da escolha de candidatos em convenção, é assegurado o direito de resposta a candidato, partido ou coligação atingidos, ainda que de forma indireta, por conceito, imagem ou afirmação caluniosa, difamatória, injuriosa ou sabidamente inverídica, difundidos por qualquer veículo de comunicação social.
Resolução TSE 23.551/2017
Art. 23. A propaganda eleitoral na internet poderá ser realizada nas seguintes formas (Lei nº 9.504/1997, art. 57-B, incisos I a IV):
(...)
§ 6º A manifestação espontânea na internet de pessoas naturais em matéria político-eleitoral, mesmo que sob a forma de elogio ou crítica a candidato ou partido político, não será considerada propaganda eleitoral na forma do inciso IV, devendo observar, no entanto, os limites estabelecidos no § 1º do art. 22 desta resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 57-J).
Ab initio, vale frisar que os conceitos de calúnia, injúria e difamação têm aplicação menos rígida na esfera eleitoral, uma vez que o homem público, especialmente político, deve estar sujeito a críticas, com a consequente diminuição da proteção de seus direitos de personalidade. Leciona Olivar Caneglian: “O homem público, principalmente o que está no exercício do poder de administração, ou aquele que se submete ao crivo de uma eleição, fica sujeito a críticas mais acerbas e mais generalizadas. Muitas vezes, essa crítica é injusta, mas não chega a caracterizar injúria ou difamação.” (Propaganda Eleitoral de acordo com o código eleitoral e com a lei 9.504/97, Juruá, 2004, 6ª edição, pág. 219).
Não restam dúvidas, ademais, que a ofensa divulgada por qualquer veículo de comunicação, como apregoado pelo dispositivo retrotranscrito, abrange possíveis ofensas na internet. No entanto, conforme melhor doutrina: “a legislação eleitoral disciplina o instituto no contexto da propaganda eleitoral, de modo que postagens e comentários realizados por usuários e que não caracterizem propaganda eleitoral propriamente dita não devem ser aptos a ensejar direito de resposta. A corroborar esse entendimento, a Lei 13.188/2015, que disciplina o exercício do direito de resposta ou retificação, deixa claro que tal prerrogativa não se aplica em relação ao conteúdo orgânico, ou seja, a postagens e comentários realizados por usuários da internet. O direito de resposta é assegurado ao ofendido estritamente nas hipóteses de divulgação de “matéria”, isto é, reportagem, nota ou notícia divulgada por veículo de comunicação social. Postagens em redes sociais e outras aplicações não se enquadram na definição legal de “matéria”, sendo, na verdade, expressamente excluídas de tal conceito.” (Direito eleitoral digital/ Diogo Rais, coordenador; Diogo rais….(et al.). São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018)
Desta forma, não configurada propaganda eleitoral, não há que se falar em direito de resposta.
Por outro lado, vale frisar que a veiculação de direito de resposta na internet cabe ao ofensor, inclusive em razão da função pedagógica da responsabilização deste pelos seus próprios atos. Até porque, sem tomar conhecimento sobre a irregularidade cometida, o usuário poderia continuar a praticar o ato que a Justiça coibiu.
Obrigar o provedor a divulgar direito de resposta “representaria punir terceiro (o provedor de aplicação de internet) que não tem controle editorial sobre o conteúdo reputado ilícito). A veiculação da resposta haveria de ser efetiva pelo provedor, que, diferentemente do que geralmente ocorre nos veículos de comunicação tradicionais, não detém influência, ingerência, participação ou controle editorial sobre o conteúdo veiculado.” (Direito eleitoral digital/ Diogo Rais, coordenador; Diogo rais….(et al.). São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018).
Pelo exposto, considerando a ausência de propaganda eleitoral e de identificação do usuário responsável pela postagem, assim como diante da impossibilidade do provedor ser obrigado a veicular direito de resposta e acolhendo o parecer ministerial, julgo IMPROCEDENTE a representação, com fulcro no artigo 487, I c/c artigo 58 da Lei 9.504/1997 e artigo 23 da Resolução TSE 23.551/2017.
Intimem-se as partes e a Procuradoria Regional Eleitoral, arquivando-se na ausência de recurso.
Conforme solicitado pela defesa, façam-se as intimações do representado exclusivamente em nome do advogado CELSO DE FARIA MONTEIRO, OAB/PI 13.650.
À Secretaria Judiciária para os expedientes necessários.